domingo, 4 de dezembro de 2016

SAGA INTERNACIONAL - 2/6


TÓPICOS DESTA PARTE DO PRESENTE CAPÍTULO:
Nomes, épocas e circunstâncias;
Guerra no mundo...;
Frederico no Japão -  Embaixador do Brasil;
Frederico outra vez na França, agora como Embaixador


Nomes, épocas e circunstâncias
    James Frederick Clark era chamado Fred na Inglaterra e James no Brasil. Por isso, seu primogênito recebeu o nome de Frederico. Na geração seguinte, minha mãe deu o mesmo nome ao primogênito dela. Na família eles eram chamados tio Freddie e  Fred.
  
   Na foto ao lado, tirada em Keswick em 1908, são vistos o 1º Fred referido neste relato (meu avô James Frederick) e seu primogênito, Frederico (meu tio Freddie), que é o 2º Fred. A menina de dez anos é Marie, que em 1921 haveria de casar com o jovem Celso Augusto de Moura Nunes, com quem haveria de ter seis filhos, sendo Fred o mais velho e James Kelso o mais novo. Meu irmão, portanto, é o 3º Fred.
As demais são: sentadas - minha avó Magdá (Ana Gonçalves Castello Branco Clark) e Maria (com vestido escuro); esta era irmã de meu avô e Mamãe a chamava “tia Maraia”; em pé - Flora (irmã de minha mãe, a quem chamávamos tia Florrie) e Maria Florência Castello Branco (irmã de minha avó, conhecida como Flora ou Titia). 
   Nessa época o tio Freddie estava iniciando sua carreira diplomática - como Adido à Legação do Brasil em Londres junto à Corte de Saint James.

Abro um parêntese: Num olhar retrospectivo posso imaginar como seus pais deviam estar agradecidos a Deus pela felicidade representada pelo fato de seu primogênito haver sido designado justamente para a Inglaterra, de onde o pai saiu como humilde aprendiz de comércio (sem falar português) e onde a mãe chegou ainda menina (sem falar inglês) para estudar como interna em um colégio de freiras. Haja gratidão e haja emoção para vivenciar essa verdadeira saga.   Fecho o parêntese.

   Prosseguindo em sua trajetória na diplomacia, Frederico veio a exercer funções em outros países - Argentina, Chile, Peru, França, Suíça, Brasil, Bolívia, Cuba e Suécia - antes de ser promovido a Embaixador (em 1938) conforme mencionado adiante.
   Por associação de ideias entrelaço alguns fatos históricos às vidas de pessoas que, em três gerações, eram chamadas “Frederico”: meu avô, meu tio e meu irmão.   

   Lembrando que o pai de minha mãe tinha o nome duplo de James Frederick e que ela escolheu o segundo para o seu primogênito (fotos acima), esclareço que eu herdei o primeiro nome - James. A esse ela acrescentou outro, dando-me o nome duplo de James Kelso. Assim, ela homenageou seu pai e o meu – Celso.
   Mamãe substituiu a letra C por K - favorecendo a sonoridade e recordando a cidade escocesa de Kelso (que ela conhecia), próxima a Keswick, terra de meu avô. 
   Na geração seguinte, minha esposa, Carminha, escolheu meu nome para nosso primogênito - James Kelso Clark Nunes Junior (nascido em 31.10.1950); e para nosso caçula escolhemos Kelso Correia Clark Nunes (nascido em 17.6.1963). Mamãe gostava de ter 2 “James” e 3 “Kelso” entre seus descendentes.
   O cartão postal acima, que reproduzo junto com a mensagem manuscrita no verso, foi enviada a mim e tem a seguinte tradução: “Kelso, Escócia, 16 Agosto, 1963. Ao James Kelso e família, incluindo os outros dois Kelsos, com os melhores votos e saudades – dos visitantes de Kelso: Celso Nunes, Marie, Edith, Stuart.”   Trata-se de meus pais, uma prima e seu marido.
   Quando, na cidade escocesa de Kelso, meu pai (Celso) escreveu aquele cartão, as idades dos 3 Kelsos nele referidos eram as seguintes: o 1º (eu) - 35 anos; o 2º (James Kelso Clark Nunes Junior, meu primogênito) - 12 anos; e o 3º (Kelso Correia Clark Nunes, meu caçula) - 2 meses.
  
Guerra no mundo...
   Corria o ano de 1939 quando o mundo foi atingido pelo impacto das notícias do bombardeio de Varsóvia e da invasão da Polônia, na primeira demonstração da apavorante "Blietzkrieg" (Guerra Relâmpago) das Forças Armadas da Alemanha Nazista. Era, deploravelmente, o início da 2ª Guerra Mundial, no dia 1º de Setembro.
   Meus pais estavam em alto-mar, regressando de Nova York num navio norueguês; foi pelo rádio de bordo que tomaram conhecimento da terrível realidade, quando o comandante alertou para o perigo de afundamento por parte dos alemães.
   A propósito de torpedeamento de navios, faço o seguinte destaque: no mesmo mês em que a guerra começou (no dia 30) o "Clement" foi afundado ao largo do litoral do Nordeste. Eu ainda não tinha doze anos, mas não esqueço como foi chocante para Parnaíba a constatação de que os alemães não atacavam só na Europa!
Meu pai já havia importado mercadorias e exportado cera de carnaúba por intermédio daquele cargueiro inglês; e eu já o havia visto bem de perto em 1938, quando o navio “Pará”, no qual eu e Mamãe estávamos regressando do Rio, ancorou no porto de Mucuripe, em Fortaleza.
   A foto ao lado, tirada em Nova York na semana anterior ao início da guerra, mostra meus pais (à direita) e um casal amigo - Mr. Hoffmann e esposa; ele presidia a Strohmeyer & Arpe Co., para quem a firma Celso Nunes costumava exportar cera de carnaúba; sete anos depois, eles foram muito gentis comigo - quando aos 18 anos fui estudar na América.
   O mencionado “Clement”, da Booth Line, foi mais uma das vítimas do "Graf Spee", que o afundou a tiros de canhão após ordenar a evacuação de todos os tripulantes – a maioria dos quais chegou às praias de Pernambuco em botes salva-vidas. O fato é relatado no livro "Encouraçados e Cruzadores do III Reich", lançado em 1992 pelo meu ilustre companheiro Argos Vasconcelos, ex-Governador do Distrito 4490 do Rotary.
  
Abro um parêntese: Sobre o assunto, registro algumas coincidências que marcaram época em minha vida: no livro acima mencionado o autor, referindo-se ao "Graf Spee",  cita várias vezes o  cruzador inglês "Cumberland", que participou de importante batalha nas costas do Uruguai, juntamente com o "Ajax" e outros. Pois bem, justamente em Cumberland conheci um motorista inglês que participou daquela operação de guerra naval como tripulante do "Ajax". O assunto veio à baila porque em seu carro estavam quatro pessoas do Brasil, país que ele disse haver conhecido quando a referida belonave aportou no Rio de Janeiro. O esclarecimento veio logo a seguir...: aposentado e morando nas cercanias de Keswick (Cumberland), aquele veterano da 2ª Guerra Mundial operava um táxi no qual eu, Carminha e nossos diletos amigos Jaime Aquino e Aílame visitamos em 1985 a deslumbrante região onde nasceu o pai de minha mãe.  Fecho o parêntese.

   Aquele motorista podia se envaidecer de haver combatido na dramática e tenaz batalha dos ingleses contra o poderoso "Graf Spee". O episódio culminou, após complexas gestões militares e diplomáticas, com a surpreendente e fragorosa autodestruição do imponente vaso de guerra. Na época – 1939 – o Brasil esteve alvoroçado com o estabelecimento de um verdadeiro palco de guerra próximo de nossas fronteiras. Eu ouvia, interessadíssimo, os ruidosos noticiários do rádio de meu pai, que me explicava tudo e ainda conversava com os ingleses (da Booth), na então pequenina Parnaíba; pequenina mas acolhedora e admirável por todos os motivos!
   Transcorrido tanto tempo, torna-se oportuna a reflexão sobre fatos históricos, seus erros, acertos e consequências, para recordar a trágica lição das guerras: elas humilham a ambição e a prepotência, como a do herói germânico Graf Spee (abatido na 1ª Guerra Mundial) e a do moderno navio que ostentava seu nome (derrotado na 2ª); e como a do cruel ditador da Alemanha Nazista - Adolf Hitler -  cujo fim foi ignóbil.

Frederico no Japão -  Embaixador do Brasil
   Corria o ano de 1941 quando, no dia 7 de Dezembro, o mundo foi novamente abalado, desta vez pela notícia que sinalizava uma incalculável ampliação do conflito mundial. Foi o espantoso bombardeio de Pearl Harbor, no Havaí; ali, centenas de aviões da Marinha Japonesa destruíram navios da Marinha Americana quando seus países ainda não estavam em guerra...; e ela haveria de culminar com as duas únicas bombas atômicas até hoje lançadas sobre cidades (Hiroshima e Nagasaki, em 6 e 9 de Agosto de 1945).
   Em 1942 o Brasil declarou guerra à Alemanha e a Itália; e rompeu relações com o Japão. Consequentemente os japoneses mantiveram os diplomatas brasileiros presos na sede da embaixada em Tokyo, ao longo de meses, até serem levados para a África (Moçambique) e liberados. Nosso Embaixador era Frederico de Castello Branco Clark, desde 1938. De volta ao Rio de Janeiro, meu tio Freddie foi recebido pelo Presidente Vargas de forma afetuosa, compensando as agruras sofridas nos meses anteriores. Lá ele permaneceu - no Itamarati - como Presidente do Conselho de Imigração.

Frederico outra vez na França, agora como Embaixador
   Em 1944 o Governo o enviou para a Argélia (território francês na África do Norte), onde o General Charles De Gaulle havia estabelecido a “França Livre”- em Maio de 1943. Em Outubro de 1944 ocorreu a liberação de Paris pelos “Aliados” (sob o comando do General Dwight Eisenhower) e De Gaulle assumiu a Chefia do Governo Francês, em sua reconquistada capital, onde Frederico Clark permaneceu até 1948 como Embaixador do Brasil em Paris.  Lá ele veio a ser distinguido com a maior condecoração concedida pela França a um estrangeiro – a "Legião de Honra".

   Seu subsequente e último posto foi Embaixador do Brasil junto à Santa Sé, no Vaticano. Na foto  ao lado, tirada por meu pai em 1950, em Roma, o tio Freddie é visto com sua irmã caçula (Marie, minha mãe) e a sobrinha Sônia (minha irmã).  
   Lá ele atingiu a idade de aposentadoria compulsória. Ao envelhecer, retornou para o Piauí, tendo passado a última fase de sua vida em Parnaíba, onde faleceu em 1971. Ele não teve esposa nem filhos.
   Dando continuidade à saga iniciada pelos seus pais, a quem tanto amou, ele foi sepultado ao lado dos mausoléus de James Frederick e Magdá. Meus avós já haviam seguido o caminho de todos os mortais, sendo lembrados e honrados pelos seus numerosos descendentes. 

Abro um parêntese: Observei as seguintes coincidências:
1ª - Na época de Pearl Harbor residiam em Tokyo dois diplomatas de sobrenome Clark - Joseph Clark Grew (desde 1932) e Frederico C. B. Clark  (desde 1938) - Embaixadores dos Estados Unidos e do Brasil;
2ª - um faleceu seis anos antes do outro, mas quando morreram tinham a mesma idade (com diferença de meses) - 84 anos;
3ª - pelo falecimento do americano, a revista Time (de 4.6.1965) noticiou a ocorrência e esclareceu que J. Clark Grew simbolizava o que havia de melhor na diplomacia americana. Pelo falecimento do brasileiro, o Presidente da Academia Brasileira de Letras (Austregésilo de Atayde) publicou no Rio de Janeiro (em 1971) um artigo sob o título “Desapareceu um embaixador perfeito” – referindo-se a Frederico Clark;
4ª - Joseph foi enterrado na pequena cidade de Manchester (em Massachussets); a grande cidade inglesa mais próxima da pequena Keswick (onde teve início a saga deste artigo) é também Manchester;
5ª – Na época em que Paris foi libertada e Frederico Clark passou a representar os interesses do Brasil na França, o general Mark Clark comandava na Itália o V Exército Americano, ao qual estava integrada a Força Expedicionária Brasileira (sob o comando do General Mascarenhas de Morais).
   Não sei se os dois diplomatas (contemporâneos numa época marcante da história japonesa) e o general (a quem estiveram ligados 25.000 brasileiros da FEB) - os três com o mesmo sobrenome Clark - eram originários do mesmo tronco de uma família inglesa da qual alguns jovens, em passado remoto, emigraram para o Novo Mundo, sendo dois para a América do Norte e um para a América do Sul.   Fecho o parêntese.

Em 2011 (40º aniversário da morte de meu tio Freddie) escrevi o capítulo “Um parnaibano nas duas guerras mundiais” - no livro “Compartilhando Riquezas de Vida”, que publiquei em 2014. Talvez eu ainda venha a adaptar aquele artigo para oferecer aos leitores deste blog.

Fim da parte 2/6                                                                           Continua na parte 3/6
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SAGA INTERNACIONAL    -     6  PARTES     -    SUMÁRIO

1/6 - Saga internacional; Transplante; “Árvore do vovô”; Inglês que amava o Brasil e brasileira que amava a Inglaterra; Dedicação e fidelidade premiadas; Entreposto comercial na foz de um grande rio

2/6 - Nomes, épocas e circunstâncias; Guerra no mundo...; Frederico no Japão -  Embaixador do Brasil; Frederico outra vez na França, agora como Embaixador

3/6 - Submarinos x Aviões; Cooperação Brasil – USA; Paz e Esperança; Sonhos x Realidade 
 
4/6 - Aviação - Parnaíba entre Nova York e Buenos Aires; Aviação - Panair e Celso Nunes; Aviação - Na paz e na guerra; Aviação - Honra ao mérito e expansão

5/6 - Negócios e Famílias - mudanças e bênçãos; Árvore comercial plantada por meu pai  -  há 80 anos; James Kelso no Rotary International

6/6 - Elos de amor unindo gerações; Floresta de árvores genealógicas; Brasil e Inglaterra; Conclusão
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 “O SENHOR é bom para todos, e as suas ternas misericórdias permeiam todas as suas  obras.”  (Salmo 145.9)

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